Rapport: como estabelecer uma relação de confiança usando técnica da Mediação de Conflitos - Momento Arbitragem

Rapport: como estabelecer uma relação de confiança usando técnica da Mediação de Conflitos

Adam Tecnologia
Poderia haver maior milagre do que olharmos com os olhos dos outros por um instante?
Henry David Thoreau
Imagine que você acabou de conhecer uma pessoa interessante e significativa para sua vida pessoal ou profissional. Suponha que você pretenda estabelecer um contato positivo ou que deseje que ela faça parte de sua vida de alguma maneira. Será que existe uma fórmula ou estratégia de aproximação que construa credibilidade e confiança, tornando o encontro valioso para ambos?
Sim. Isso pode ser realizado por meio do Rapport, uma técnica da Psicologia e da Mediação de Conflitos, facilitadora de qualquer negociação, que pode ser usada no contexto dos relacionamentos pessoais e profissionais. Ela se mostra muito útil porque é capaz de criar conexão e empatia entre as pessoas.
Na Psicologia, a técnica é responsável por fazer com que o cliente se abra e revele informações sobre suas motivações, traumas, necessidades e medos, permitindo que o profissional possa intervir para ajudá-lo.
Na Mediação de Conflitos, o Rapport é utilizado pelo Mediador no primeiro estágio do tratamento da controvérsia e tem como objetivos: a) promover o contato inicial com as partes; b) construir credibilidade; c) instruir as partes sobre o processo e 4) aumentar o compromisso em relação ao procedimento (MOORE, 1998, p. 66).
Mas para que esta ferramenta seja utilizada no cotidiano, gerando fluência e aproveitamento das potencialidades do encontro, recomenda-se: escutar ativamente a outra parte, ser empático, mostrar sensibilidade, zelar pela confidencialidade do diálogo e usar o silêncio como estratégia durante a interação.
O primeiro ponto que se destaca, diz respeito à habilidade de escutar ativamente. Tal competência, refere-se à compreensão do que está sendo dito sem influência de julgamentos ou juízos de valor. Quem escuta ativamente, olha nos olhos do interlocutor, sem interrompê-lo durante sua fala. Como o corpo também se comunica, deve-se demonstrar, ao mesmo tempo, por linguagem corporal, que se está prestando atenção ao que é dito, ainda que não se concorde (Manual de Mediação do Conselho Nacional Justiça, 2016).
Na Mediação de Conflitos, o ato de escutar ativamente – com o semblante aberto e uma postura cooperativa –, auxilia o Mediador a identificar as questões mais importantes da disputa, bem como as emoções e as dinâmicas envolvidas, aumentando a eficiência das intervenções.
Outra sugestão que viabiliza o Rapport é ser empático, ou seja, usar a “arte de se colocar no lugar do outro por meio da imaginação, compreendendo seus sentimentos e perspectivas e usando essa compreensão para guiar as próprias ações” (KRZNARIC, 2015, p. 10). Uma pessoa empática consegue entender melhor a perspectiva da outra parte, bem como suas necessidades, razão pela qual obtém maior receptividade e abertura em qualquer encontro.
Além disso, questão crucial diz respeito a mostrar sensibilidade no trato com as pessoas. Trata-se de uma qualidade importante para a construção de relacionamentos e da credibilidade em qualquer interação, porque ela valida o sentimento dos outros e as questões trazidas no diálogo.
Outro ponto chave para o sucesso no Rapport é zelar pela confidencialidade do conteúdo revelado no diálogo. Tanto na Mediação, quanto nas relações do dia a dia, as pessoas precisam perceber que o que foi dito ao outro permanecerá em sigilo. Segundo o Manual de Mediação do Conselho Nacional de Justiça (2016):
A confidencialidade das informações dentro do processo de mediação é um outro fator que influencia na construção de uma relação de confiança das partes com o mediador. Quando as partes sabem que nada do que foi dito no processo de mediação poderá ser usado em outro processo ou ambiente em seu desfavor, sentem‑se muito mais à vontade para revelar informações importantes acerca da controvérsia.
Outra fonte importante para desenvolver um bom diálogo é usar o silêncio. Trata-se de uma estratégia ignorada por muitos oradores, mas valiosa para criar uma boa impressão. O Autor do livro “O Ofício do Mediador”, Luis Alberto Warat, sabia usar o silêncio para provocar reflexão nas pessoas. Em suas palestras e aulas era mestre em fazer pausas. O Manual de Mediação do Conselho Nacional de Justiça também destaca o uso dessa medida:
O silêncio pode ser utilizado pelo mediador com vários objetivos no processo de resolução de disputa. A situação de silêncio provoca nas partes a reflexão, ainda que momentânea, sobre a forma como estão agindo. Nesse sentido, quando uma parte dá sinais de que dará um passo importante para resolução de controvérsia (que pode ser uma concessão, o reconhecimento de um erro ou um pedido de desculpas, por exemplo), é interessante que o mediador teste esta técnica. Assim, em vez de fazer perguntas na ânsia por solucionar a controvérsia o quanto antes, em algumas ocasiões o silêncio do mediador provoca uma inquietação na parte e a faz concluir, após esta breve pausa, o pensamento que não estava bem estruturado no início de seu discurso.
Contudo, caso nenhuma dessas técnicas ajudem a criar um contato inicial satisfatório, seja porque se está diante de histórias entediantes ou de timidez do interlocutor, Christopher Moore (1988, p. 88), nos apresenta uma valiosa experiência para auxiliar no reforço do Rapport:
Em uma intervenção ocorridas alguns anos atrás, eu estava encontrando muita dificuldade em construir rapport com uma parte pelo telefone. Ele respondeu muitas perguntas, até mesmo perguntas abertas, com lacônicos sim ou não ou com um grunhido. Finalmente, perguntou como estava o tempo no colorado, e eu soube que esta era a abertura. Ao saber que estava nevando, ele começou a recordar o tempo que passou nas montanhas. Eu prossegui fazendo algumas perguntas abertas sobre suas experiências e, após alguns minutos, descobrimos que ambos acampamos no inverno. O início do rapport foi estabelecido.
Todos os dias enfrentamos situações de conflito, temos a oportunidade de conhecer novas pessoas e de melhorar a qualidade dos nossos relacionamentos. A Mediação, em razão de ser um tema interdisciplinar, oferece estratégias e ferramentas práticas que podem ajudar a criar mais conexão, empatia, confiança e credibilidade nas relações interpessoais. Todo esse conhecimento oferece a oportunidade de empoderamento, na medida em que possibilita uma transformação interna capaz de impactar positivamente na forma com que nos relacionamos com as pessoas e lidamos com os problemas.
Notas e Referências:
BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Azevedo, André Gomma de (Org.). Manual de mediação judicial, 6. Edição (Brasília/DF:CNJ), 2016.
MOORE, Christopher W. O processo de mediação: estratégias práticas para resolução dos conflitos. 2. ed. Tradução de Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 1998.
WARAT, Luis Alberto. Surfando na pororoca: o ofício do mediador. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004.
KRZNARIC. O Poder da empatia: a arte de se colocar no lugar do outro para transformar o mundo. Tradução de Maria X. de A. Borges. 1ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2015.
Por Juliana Ribeiro Goulart, possui graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS. Mestranda em Teoria e História no Direito (UFSC). Tem experiência na área da advocacia, com ênfase em Direito Processual, área em que é especialista pelo CESUSC. Atualmente ocupa o cargo de Assistente Jurídica da Procuradoria Geral do Estado de Santa Catarina e é pesquisadora na área da Mediação de conflitos. E Jéssica Gonçalves, Graduada em Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL. Formada pela Escola da Magistratura do Estado de Santa Catarina. Pós-Graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Pós-Graduada em Direito Público pela Universidade Regional de Blumenau – FURB. Pós-Graduada em Direito Aplicado pela Universidade Regional de Blumenau – FURB. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
Fonte: Empório do Direito – 17/11/2016.
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